MACBETHS, de William Shakespeare,
tradução e dramaturgia de Luísa Costa Gomes,
encenação de António Pires,
Ruínas do Convento do Carmo, 1 de Agosto de 2018
|
Macbeths não é Macbeth, embora também o seja. É uma peça-em-peças, construída com excertos de outros textos de Shakespeare, nomeadamente Macbeth, Ricardo II, Otelo, Hamlet, Rei João, Como queiram, Henrique V, O mercador de Veneza e um ou outro soneto. Macbeths pretende imaginar o que não se vê na peça de Shakespeare, sobretudo no que diz respeito à acção de Lady Macbeth, mantendo ao mesmo tempo intocado em linhas gerais o enredo da tragédia de Shakespeare. Aqui segue-se Lady Macbeth nas suas repetidas tentativas de reposição da boa ordem. A peça constrói-se em três momentos: primeiro, o sonho do poder, plantado em ambos pela superstição de um destino superior; segue-se o tédio e o pesadelo do poder, depois do assassinato do Rei Duncan, que leva Lady Macbeth ao remorso, Macbeth à orgia homicida - e o casal à separação de facto. Enquanto Macbeth destrói, a Senhora procura minimizar os danos, dilacerada entre a lealdade que deve a Macbeth tresloucado e suicida e a necessidade de não ser sua cúmplice na destruição.
Porquê e para quê remexer em textos perfeitos? Para quê estragar o que é tão belo e tão verdadeiro? Talvez não passe, também este tipo de respeitosa e amorosa paródia, de um vão exercício de poder. Mas Macbeth, sendo uma tragédia perfeita, um texto que não esmorece, que não perde vitalidade, que continua a convocar-nos, gera esta e infinitas leituras. Impôs-se-me outra versão de Lady Macbeth, normalmente vista como serpente tentadora, figura diabólica que manipula, força e depois abandona o cúmplice e se abandona ela própria à loucura. Partindo daquele enigmático desmaio, daquele “Oh, ajudai-me!”, fui à procura da outra metade da peça, e pensar o que terá ela andado a fazer fora de cena. Quem é ela? Quais os seus motivos, o motivo do seu desmaio, que amor desvairado é o seu, que suposta loucura...para além da harpia, da bruxa má, da mãe castradora, andei à procura dela e o que encontrei...foi outra pessoa.
A dramaturgia dos Macbeths
Propus ao Teatro do Bairro uma dramaturgia a partir da tragédia de William Shakespeare, Macbeth. O meu projecto era criar uma outra “peça”, chamada Macbeths, com textos de Macbeth, Ricardo II, Otelo, Hamlet, Rei João, Como queiram, Henrique V, O mercador de Veneza e um ou outro soneto. Macbeths pretende imaginar o que não se vê na peça de Shakespeare, sobretudo no que diz respeito à acção de Lady Macbeth, mantendo ao mesmo tempo intocado em linhas gerais o enredo da tragédia de Shakespeare. É sobre este processo de recriação e descoberta que pretendo falar-vos. Qualquer pessoa sensata me teria parado logo ali. O produtor, primeiro, o encenador, depois. Mas estar rodeada de artistas tem os seus custos. Escrever um Macbeth com textos que não são do Macbeth contando uma história paralela pareceria, à partida, ou a meio caminho – como me pareceu logo – uma ideia peregrina. Mas a história da dramaturgia é feita de ideias peregrinas e quem nunca se lembrou de uma ideia absurda que atire a primeira pedra. Há uma questão prévia a toda a dramaturgia de “composição”, vamos chamar assim, que é a de saber da sua legitimidade. Se considerarmos que Macbeth é o arquétipo do ambicioso e Lady Macbeth o arquétipo da víbora edénica tentadora, então a peça é intocável e a sua tragédia, a juntar à tragédia de que já são protagonistas, é justamente estarem presos para sempre ao arquétipo e o texto não se poder dinamitar. Deixem-me contar-vos, em linhas gerais, o que acontece na tragédia de Shakespeare, Macbeth, editada em 1623. As fontes para a peça são factos históricos algo modificados, encontrados nas crónicas de Holinshed de meados do século XVI. Macbeth foi Rei da Escócia entre 1040 e 1057 e sucedeu de facto a Duncan. Vou dizê-lo nas palavras de um dos seus primeiros críticos, Simon Forman que viu uma récita no Globe Theatre em 1610 ou 11 e fez pouco mais do que resumir (mal) o enredo: “o que se via, era que Macbeth e Banquo, dois fidalgos escoceses, cavalgando por um bosque, lhes aparecerem de rompante três fadas ou ninfas e saudaram Macbeth três vezes com Salve, Macbeth, rei de Codon; serás rei, mas não hás-de gerar reis”. Ali interessa-me o facto de as célebres bruxas nunca serem chamadas bruxas na peça (apenas na didascália, sete vezes, o que suspeito ser posterior). Elas aparecem sempre tratadas como Weird Sisters, ou seja, seres com poderes sobrenaturais, profetizas, adivinhas, fadas, que foi a tradução que escolhi. Na peça, a única personagem que lhes chama witches, é uma das Weird Sisters, numa encantação. Macbeth chama-lhes com respeito Weird Sisters. E quando se zanga chama-lhes uma vez midnight hags e outra filthy hags. Primeiro, temos Macbeth e Banquo, que vêm de uma batalha. Atravessam uma charneca, com alguma premonição de prodígio por vir: “so fair and foul a day”. Esta preparação, este estar pronto para o prodígio é fundamental na abertura de espírito com que Macbeth acolherá as predições das irmãs adivinhas. A descrição das façanhas de Macbeth é feita entretanto por um Sargento ao Rei Duncan. O que se descreve é um herói um tanto alucinado, abrindo caminho sozinho pelo meio das fileiras de noruegueses bandeados com o traidor Cawdor, o barão escocês de quem Macbeth herdará o título. Macbeth descose-o de alto a baixo. Vem, como se percebe, bastante alterado, embora seja apenas mais um dia de trabalho na guerra dos barões…Estas irmãs fadas são mais personagens de comédia do que de tragédia. Na minha perspectiva, seriam uma espécie de comic relief com que o horror era mitigado. Percebe-se que são mazinhas e marotas, e que roubam castanhas a desgraçadas que pouco têm. Propõem-se, como esses duendes que pregam partidas, brincar com as próprias ilusões de Macbeth. Aparecem-lhe e vaticinam três coisas: primeiro, que Macbeth será barão de Cawdor, que será Rei e quando Banquo avança, destemido, para ver se também lhe lêem a sina a ele, dizem-lhe que Macbeth será rei, mas Banquo há-de gerar uma dinastia. E desaparecem. Logo a seguir – e isto para o assentamento da profecia é fundamental – dois mensageiros de Duncan aparecem na charneca e saúdam Macbeth como Barão de Cawdor. Macbeth cai no engodo, vítima de uma visão errada do princípio de indução. Se sou Cawdor, logo, serei rei. No entanto, digamos que o número de ocorrências de profecias cumpridas não permitia tal asserção. O Rei Duncan segue para Inverness para a imposição do novo título a Macbeth. Ironicamente, Macbeth acaba por colher profeticamente um título de traidor, que ele há-de ser também. Mas Duncan é um rei bom, justo, brando, que ele serve fielmente. Não pode matá-lo para cumprir a profecia de três velhas adivinhas de barba encontradas ao acaso no caminho. Precisa de um empurrãozinho. Diz ele: “se a sorte me quiser rei, bem, ela que me coroe. Eu cá não me mexo”. O que ele faz, não se mexendo, é escrever a Lady Macbeth, contando o que se passou na charneca. Nela lhe diz que ela é a sua “prometida consorte nas grandezas” que as fadas lhe prometeram. Na tragédia de Shakespeare, Lady Macbeth aparece pela primeira vez a ler a carta de Macbeth. A cena é fulcral por várias razões: primeiro, porque Macbeth omite que as fadas profetizaram que Banquo seria a cabeça de uma dinastia, e que o seu reinado, deles, Macbeths, seria ou estéril ou destruído, fazendo Lady Macbeth crer que os seus filhos serão reis, ou seja, de certa maneira, dando alguma vantagem ao homicídio de Duncan. Em segundo lugar, ela aceita de Macbeth o papel de “estribo onde ele apoia a espora da coragem”. Ou seja, aceita ser a víbora tentadora, porque acha que ele é ao mesmo tempo capaz de matar Duncan, mas incapaz de matar Duncan. Ela diz isto, no seu monólogo em que se convence a si própria do seu papel fundamental como “facilitadora” da maldade do seu herói, como a mãe que vicariantemente triunfa no filho sempre um pouco aquém das suas expectativas: “temo a tua natureza, demasiado cheia do leite da bondade para cortar atalhos: serias grande, não te falta ambição, falta-te a maldade que lhe deve assistir: queres as alturas, mas a bem, sem jogo falso. E, no entanto, queres aquilo a que não tens direito. Aceitas (…) a intimação: “É o que tens de fazer, se queres tê-lo”. Mas queres tanto fazê-lo, como vê-lo desfeito”. Este monólogo tem a sua imagem especular no monólogo de Macbeth, agonizando já sobre o crime que não quer nem pode cometer, mas quer ter cometido. Não quer passar pelo acto, quer já tê-lo feito. Para ser a víbora, Lady Macbeth tem de ser o homem do casal. E tem esta invocação, que pede aos espíritos “unsex me”: Vinde, espíritos que cuidais Dos desejos de morte, castrai-me da minha Parte de mulher, enchei-me da cabeça aos pés Da mais crua vilania! Tornai-me espesso o sangue Estancai a passagem e o acesso ao remorso. Que não haja visitas da Natureza compassiva A abalar o meu propósito e a promover a paz Entre ele e o seu efeito! Vinde, e nestes peitos Trocai o leite por fel, ó ministros assassinos, Onde estejais, nas vossas substâncias invisíveis Servindo a maldade na Natureza! Vem, noite escura, Cobre o mundo com o fumo negro dos infernos Para que a lâmina não veja a ferida que provoca. Que o céu não espreite p´lo manto das trevas Para gritar: “Pára! Pára!” . Está preparado o acto. Macbeth, quando volta a Inverness, já desistiu da empresa. Percebe que Duncan vai agraciá-lo com mais títulos, não lhe fica bem matar o rei no seu próprio castelo, onde lhe deve, para além de lealdade, direito de familiar e hospitalidade. Nas discussões que se seguem, digamos que Lady Macbeth não está no seu melhor. A sua obtusa teimosia em prosseguir um plano de que Macbeth já desistiu, dar-lhe-á pelos séculos uma reputação de bruxa má. Eu ponho muito deste calor dialéctico na conta da cena conjugal. Mas admito estar a tratá-la com uma grande margem de boa vontade. A verdade é que ela é uma senhora, esposa de seu marido, que lhe mandou dizer o que era preciso fazer para serem ambos reinantes. É ela que diz: “deixa que eu tenho um plano, eu trato de tudo”, excepto do pequeno pormenor de esfaquear o Rei enquanto ele dorme. O que se lhe aponta é esta passagem infeliz, para esmagar a resistência de Macbeth. Quem nunca disse uma loucura infeliz numa discussão acesa, não pode compreendê-la. LADY MACBETH Estava bêbeda a esperança de que te vestiste? Já dormiu? E acorda agora, esverdinhada e Macilenta, na ressaca do que livremente fez? Doravante, é o que pensarei do teu amor. Tens medo de ser no feito e na coragem O mesmo que és no desejo? Queres ter O bem mais precioso e ornamento desta vida - Assim o consideras! -, e vives como um cobarde Faltando à consideração que a ti próprio deves Deixando o “Não me atrevo!” rebaixar o “Quero!”, Como o gato do conto que queria agarrar o peixe Sem molhar as patas. MACBETH Silêncio, por favor! Atrevo-me a tudo o que é próprio de um homem. Quem se atreve a mais, é porque o não é. LADY MACBETH Então que besta era essa que me anunciou O teu intento? Quando tal ousaste, Então sim, foste um homem. E para seres mais do que eras Serias muito mais homem ainda. Nem o tempo, nem o lugar se concertavam Mas tu quiseste acertar ambos: E eles se concertaram e o acerto agora Te desconcerta. Dei de mamar, e sei Como é doce amar o bebé que tenho ao peito: Mas era capaz, estando ele a sorrir para mim, De arrancar o mamilo às gengivas desdentadas E rebentar-lhe os miolos, se o tivesse jurado Como tu juraste fazer isto. MACBETH E se falharmos? LADY MACBETH Falhamos. Escora bem a coragem no estribo certo E não falharemos. Quando Duncan dormir - E a dura jornada deste dia cedo à cama O há-de convidar – vinho levarei Aos camareiros, e com eles hei-de festejar Até que a memória, guardiã do cérebro, Seja vapor, e o receptáculo da razão Um alambique: e no sono de suínos Jazam as suas naturezas ensopadas Como mortas. O que não poderemos nós fazer A Duncan, estando ele sem guardas? E o que não poderemos nós imputar Aos guardas que beberam como esponjas Arcando eles com a culpa e nós com o poder? MACBETH Produz só filhos machos Que essa tua têmpera, esse destemor Deve compor só machos”. Voltamos à vexata fala: Diz Lady Macbeth: “Dei de mamar, e sei Como é doce amar o bebé que trago ao peito: Mas era capaz, estando ele a sorrir para mim, De arrancar o mamilo às gengivas desdentadas E rebentar-lhe os miolos, se o tivesse jurado Como tu juraste fazer isto”. Fala tresloucada! Macbeth poderia bem dizer, não jurei coisa nenhuma, tu é que tens essa ideia fixa. Macbeth nunca jurou matar Duncan, bem pelo contrário, logo no primeiro encontro com a mulher a quem escreveu a carta em SOS, evita falar do assunto, depois diz que já desistiu da ideia, depois diz que é homem quem não mata, porque aí reside a honra. Mas a violência da mulher (provinda do sexo masculino que ela pediu aos espíritos malignos) desmorona a parte feminina do herói que clama: tu gera-me só machos! E vai matar Duncan. Há uma outra peça de Shakespeare, Henrique VI, que tem uma cena paralela. O Duque de Gloucester, regente do reino (Lord Protector) na menoridade de Henrique VI, que herdou o trono muito criança, é abordado pela mulher, Eleanor Cobham, que o encoraja a desfazer-se da criança para reinar. Eleanor Cobham fora sua amante, depois segunda mulher. Na peça de Shakespeare, o Duque de Gloucester rejeita liminarmente tal ideia, sem sequer lhe dar foros de projecto. Na realidade, Eleanor foi julgada e condenada em 1441 por praticar feitiçaria contra o Rei, condenada ao exílio e prisão perpétua. O ponto fundamental da minha dramaturgia é o desmaio de Lady Macbeth quando se descobre o “feito horrendo”. Durante o homicídio do Rei ela é competente, ele incompetente, ela está excitada pela acção, ele preso num remorso alucinado e percebese que reagem ao stress de maneira bem diferente: Macbeth com umas falas elevadas, que recorrem a citações latinas, todo ele é elevação e elaboração, como se fugisse do horror cometido para uma estratosfera retórica protectora. Ela torna-se numa dona de casa perfeita, que tem uma ordem de trabalhos bem organizada e não aceita a mais pequena falha. O desmaio de Lady Macbeth à descoberta do cadáver de Duncan e dos dois camareiros que Macbeth matou numa fúria amante tem uma leitura canónica que me parece redutora. Lady Macbeth, a senhora do castelo de Inverness onde o crime se dá, não desmaia ao saber da morte do rei. Pergunta apenas, consciente do lugar: “O quê? Aqui?”, Em minha casa? Não, ela só desmaia quando percebe que Macbeth matou os dois camareiros do rei, que ela tinha envenenado com ponche e besuntado do sangue do rei. Ela desmaia quando ele lhe sai fora do plano, quando percebe que ele não pode ser controlado. Ou melhor, que não é ela que o poderá controlar daí em diante. E vê-se a braços com uma espécie de Frankenstein escocês, criado e desembestado por esses campos ocupado em morticínios. Data deste momento a queda de Lady Macbeth.
Naturalmente, Macbeth não pode parar de matar. A seguir será Banquo, o seu melhor amigo, e o filho dele (que escapa), depois será o clã todo de MacDuff, excepto o próprio Macduff, que foge para Inglaterra, a juntar-se a Malcolm, o filho de Duncan e indigitado herdeiro do trono da Escócia. Em aparte, pode ver-se todo um eixo de desordem retrógrada no reinado de Macbeth, patrocinado por forças trocistas e facetas, estéril, iniciado no crime contra o avanço civilizacional que um sistema centralizado de poder representa. Duncan era um rei digamos consensual, seu filho Malcolm preparado para reinar nesse mesmo consenso. Macbeth interrompe essa evolução com um acto estúpido, supersticioso, primitivo, totalmente irracional. Profetizou, no momento do assassinato de Duncan: “Macbeth matou o sono!”, e de facto, não dorme mais. Rainha, Lady Macbeth não está contente. LADY MACBETH Não temos nada, tudo se desfaz Quando o desejo satisfeito Não nos satisfaz. É mais seguro ser aquilo que destruímos Que pela destruição viver numa alegria Cheia de dúvida e suspeição. Quando tenta controlar o medo de Macbeth e lhe pergunta o que planeia ele fazer em relação a Banquo, o seu mais querido amigo e camarada, Macbeth responde: Sê inocente, não o saibas, minha pomba, Até aplaudires o feito. E assim a põe fora de combate. É apenas uma questão de tempo até Lady Macbeth estar fora de cena. Macbeth alucina no banquete em que vê o fantasma de Banquo que ele mandou assassinar e a mulher procura acalmá-lo de todas as maneiras, primeiro com ternuras, depois com algum tough love. Mas ele já está para além do seu alcance e prosseguirá a tarefa ingente de deixar uma herança de horror, já que nada pode criar senão a morte. Faz parte da loucura de Macbeth voltar a consultar as irmãs fadas, que lhe vaticinam mais uns disparates, como não poder ser morto senão por um varão “não nascido de mulher” e só poder ser derrotado quando o absurdo acontecer: quando o bosque de Birnam subir ao castelo de Dunsinane. Depois a acção rápida vai de assassinato da família de Macduff para a guerra contra Macbeth, para o duelo final com Macduff, que nasceu de cesariana (o que não qualifica, obviamente, como “não ser nascido de mulher”), mas nessa altura Macbeth já percebeu que aquilo tinha sido tudo uma brincadeira e está por tudo – perdeu a fé, até na comédia. Lady Macbeth não pode senão enlouquecer e nesse enlouquecimento lá vai dando informação sobre os crimes de Macbeth, perante assembleias bastante desinteressadas ou com medo do tirano. Aparece tentando tirar das mãos um sangue que, em boa verdade, não é da sua responsabilidade. A verdade que sempre se esquece na misoginia generalizada das leituras de Macbeth, é que ela não matou, pensou matar, planeou matar, mas nunca passou ao acto. O papel de Lady Macbeth no crime de Macbeth foi embebedar os camareiros do Rei e besuntá-los de sague. É um pouco como responsabilizar o motorista num assalto a um banco que corre mal. O seu crime foi ser cúmplice de um louco que acreditava em bruxas sem verdadeiramente acreditar. Depois ouve-se dizer que ela se atirou duma janela. Macbeth já não tem aquela cumplicidade com a mulher que lhes alumiou os inícios. Na minha leitura, o extraordinário monólogo que começa “tomorrow and tomorrow and tomorrow” pode ler-se como uma espécie de lamento de Macbeth quanto à indistinção do género literário de que ele é vítima. MACBETH deveria ter morrido mais além. Haveria um momento certo para tal palavra. Amanhã, e amanhã, e amanhã Arrasta o mesquinho passo o dia a dia Até à última sílaba do tempo e da memória E todos os nossos ontens alumiaram parvos No seu caminho breve ao pó da morte. Vela, apaga-te! Tens o pavio curto! A vida é uma sombra andante, um pobre actor Que ciranda e se dá ares uma hora sobre o palco E nunca mais se ouve: é um conto Contado por um idiota, cheio de som e de fúria, Não significa nada. E assim é, de facto. Esta história que história é? Uma tragédia que começa numa partida de fadas velhas numa charneca? Gente que não é nem mulher (porque é velha) e do homem só tem pêlos no queixo? As bruxas são este poder sem sexo, caótico, comédico, sem a solenidade da grande produção espectacular do desfile dos reis mostrada a Macbeth quando ele pede para falar com o Mago. É um género híbrido, em que a protagonista desaparece a meio, depois aparece louca e depois desaparece de vez. Mas a minha proposta de releitura radical tinha a sua raiz numa vontade de reflexão sobre a percepção da personagem de Lady Macbeth. Primeiro, na sua maldade, depois, na sua loucura. E foi a partir dessas duas referências que construí os Macbeths.
.
Naturalmente, Macbeth não pode parar de matar. A seguir será Banquo, o seu melhor amigo, e o filho dele (que escapa), depois será o clã todo de MacDuff, excepto o próprio Macduff, que foge para Inglaterra, a juntar-se a Malcolm, o filho de Duncan e indigitado herdeiro do trono da Escócia. Em aparte, pode ver-se todo um eixo de desordem retrógrada no reinado de Macbeth, patrocinado por forças trocistas e facetas, estéril, iniciado no crime contra o avanço civilizacional que um sistema centralizado de poder representa. Duncan era um rei digamos consensual, seu filho Malcolm preparado para reinar nesse mesmo consenso. Macbeth interrompe essa evolução com um acto estúpido, supersticioso, primitivo, totalmente irracional. Profetizou, no momento do assassinato de Duncan: “Macbeth matou o sono!”, e de facto, não dorme mais. Rainha, Lady Macbeth não está contente. LADY MACBETH Não temos nada, tudo se desfaz Quando o desejo satisfeito Não nos satisfaz. É mais seguro ser aquilo que destruímos Que pela destruição viver numa alegria Cheia de dúvida e suspeição. Quando tenta controlar o medo de Macbeth e lhe pergunta o que planeia ele fazer em relação a Banquo, o seu mais querido amigo e camarada, Macbeth responde: Sê inocente, não o saibas, minha pomba, Até aplaudires o feito. E assim a põe fora de combate. É apenas uma questão de tempo até Lady Macbeth estar fora de cena. Macbeth alucina no banquete em que vê o fantasma de Banquo que ele mandou assassinar e a mulher procura acalmá-lo de todas as maneiras, primeiro com ternuras, depois com algum tough love. Mas ele já está para além do seu alcance e prosseguirá a tarefa ingente de deixar uma herança de horror, já que nada pode criar senão a morte. Faz parte da loucura de Macbeth voltar a consultar as irmãs fadas, que lhe vaticinam mais uns disparates, como não poder ser morto senão por um varão “não nascido de mulher” e só poder ser derrotado quando o absurdo acontecer: quando o bosque de Birnam subir ao castelo de Dunsinane. Depois a acção rápida vai de assassinato da família de Macduff para a guerra contra Macbeth, para o duelo final com Macduff, que nasceu de cesariana (o que não qualifica, obviamente, como “não ser nascido de mulher”), mas nessa altura Macbeth já percebeu que aquilo tinha sido tudo uma brincadeira e está por tudo – perdeu a fé, até na comédia. Lady Macbeth não pode senão enlouquecer e nesse enlouquecimento lá vai dando informação sobre os crimes de Macbeth, perante assembleias bastante desinteressadas ou com medo do tirano. Aparece tentando tirar das mãos um sangue que, em boa verdade, não é da sua responsabilidade. A verdade que sempre se esquece na misoginia generalizada das leituras de Macbeth, é que ela não matou, pensou matar, planeou matar, mas nunca passou ao acto. O papel de Lady Macbeth no crime de Macbeth foi embebedar os camareiros do Rei e besuntá-los de sague. É um pouco como responsabilizar o motorista num assalto a um banco que corre mal. O seu crime foi ser cúmplice de um louco que acreditava em bruxas sem verdadeiramente acreditar. Depois ouve-se dizer que ela se atirou duma janela. Macbeth já não tem aquela cumplicidade com a mulher que lhes alumiou os inícios. Na minha leitura, o extraordinário monólogo que começa “tomorrow and tomorrow and tomorrow” pode ler-se como uma espécie de lamento de Macbeth quanto à indistinção do género literário de que ele é vítima. MACBETH deveria ter morrido mais além. Haveria um momento certo para tal palavra. Amanhã, e amanhã, e amanhã Arrasta o mesquinho passo o dia a dia Até à última sílaba do tempo e da memória E todos os nossos ontens alumiaram parvos No seu caminho breve ao pó da morte. Vela, apaga-te! Tens o pavio curto! A vida é uma sombra andante, um pobre actor Que ciranda e se dá ares uma hora sobre o palco E nunca mais se ouve: é um conto Contado por um idiota, cheio de som e de fúria, Não significa nada. E assim é, de facto. Esta história que história é? Uma tragédia que começa numa partida de fadas velhas numa charneca? Gente que não é nem mulher (porque é velha) e do homem só tem pêlos no queixo? As bruxas são este poder sem sexo, caótico, comédico, sem a solenidade da grande produção espectacular do desfile dos reis mostrada a Macbeth quando ele pede para falar com o Mago. É um género híbrido, em que a protagonista desaparece a meio, depois aparece louca e depois desaparece de vez. Mas a minha proposta de releitura radical tinha a sua raiz numa vontade de reflexão sobre a percepção da personagem de Lady Macbeth. Primeiro, na sua maldade, depois, na sua loucura. E foi a partir dessas duas referências que construí os Macbeths.
.
A personagem LADY MACBETH na tragédia de Shakespeare
Lady Macbeth aparece pela primeira vez na cena V do primeiro acto lendo a carta que Macbeth lhe enviou: nessa carta, o herói da guerra-das-duas-frentes, supomos que ainda quente da matança, anuncia à mulher que lhe apareceram, numa charneca deserta, três velhas adivinhas. Saudaram-no como Barão de Glamis, que já era, depois como Barão de Cawdor, que seria, e profetizaram que havia de ser rei. Palavras não eram ditas, chegam dois emissários do Rei Duncan que saúdam Macbeth como Barão de Cawdor. “Não está vivo o Barão de Cawdor?”, pergunta Macbeth. Por enquanto, sim, mas é um traidor, será executado, e o título é teu. Esta terrível coincidência planta em Macbeth a semente da certeza: se era Cawdor contra todas as expectativas, então poderia ser Rei. O que Macbeth omite na carta para a mulher é que esses oráculos em que ele acredita sem acreditar, também disseram que a linhagem reinante viria do seu amigo Banquo, e não dos Macbeths. Que farei com esta carta?, é a pergunta evidente da Senhora. Tendo Macbeth em alta (e baixa) conta, conhecendo o “leite da bondade” que o impede de “cortar atalhos” para a Coroa, conclui que o seu papel é instigar, motivar, pô-lo em movimento no caminho que ele afinal já segue. Lady Macbeth invoca os espíritos maléficos, para que a castrem da sua parte feminina, e estanquem todo o acesso ao leite da bondade- ou seja, para que se cumpra o que ele quer, terá de ser ela o “homem” do casal. Quando Macbeth aparece, anunciando que Duncan virá visitá-los nessa noite, já o plano está montado. Macbeth, afinal, tem dúvidas. É leal ao Rei, ao bom e brando
Duncan, ele acaba de lhe conceder o baronato, trata-o como o seu campeão. Lady Macbeth é levada nas asas de um desses excessos comuns nas discussões conjugais. E tem esta fala inadmissível: “Dei de mamar, e sei/ Como é doce amar o bebé que tenho ao peito:/Mas era capaz, estando ele a sorrir para mim/ De arrancar o mamilo às gengivas desdentadas/E rebentar-lhe os miolos, se o tivesse jurado/Como tu juraste fazer isto”. Macbeth não tem por onde fugir. Sofre a alucinação do punhal, entrega a alma, deixa-se possuir, para não ter responsabilidade no acto. O que segue é o mal- enjorcado ingénuo plano de duas almas crédulas e fundamentalmente boas. Lady Macbeth intoxica os camareiros do Rei até à inconsciência. Macbeth vai, e mata. Selvaticamente, mata Duncan. Ela espera em cena, deixou-lhe os punhais para que os pusesse, ensanguentados, nas mãos dos camareiros. Mas Macbeth reentra, desvairado. Quando ela o manda lá dentro besuntar as caras dos camareiros com o sangue de Duncan, ele recusa. Não volto lá, diz. É Lady Macbeth quem pratica a pintura. O que ela vê na câmara do Rei Duncan há-de ter algum efeito. Uma coisa é imaginar o acto, outra vê-lo feito, em todo o seu sangrento pormenor. Lady Macbeth: “Olha, as minhas mãos estão da cor das tuas, mas teria vergonha de ter um coração tão branco”. Mas a imagem do velho Rei, tão parecido com o seu pai, esfaqueado e exangue, há-de ficar a fermentar naquele espírito. Por enquanto, Lady Macbeth é só metade de si própria. Aguenta o peso do homicídio que Macbeth cumpriu. Macduff, o Barão de Fife, encarregado do despertar, descobre o Rei assassinado. Segue-se grande alvoroço. Macbeth, a pedido de Macduff, entra na câmara com Lennox, volta com Lennox e Ross. Diz que a fúria o levou a matar os camareiros, ainda adormecidos. Eles eram culpados, Macbeth amava o Rei. Lady Macbeth tem aqui o seu desmaio. Julga-se que para desviar a atenção do suspeito acto de violência gratuita de Macbeth. Os filhos de Duncan, Malcolm e Donalbain, fogem à pressa, desconfiando de toda aquela encenação. Malcolm irá pedir asilo ao Rei de Inglaterra, Donalbain segue para a Irlanda. Macbeth, o herói da guerra, lança a suspeita do assassinato sobre os filhos de Duncan. Toma conta da situação. É coroado. “É bom ser rei, mas em segurança”, diz ele de si para si. Não pára de matar: Banquo, o seu maior amigo, para evitar que a sua linhagem venha a reinar, como foi vaticinado. Depois o inteiro clã Macduff, escapando apenas o nobre Macduff, a sua nemesis, o inimigo admirado, o anti-Macbeth. Lady Macbeth procura, com mão maternal, amainar os demónios de Macbeth. Com desvelos, com afagos, com censuras, com ameaças, com todo o arsenal da preocupação amorosa. Tenta minimizar os estragos das alucinações do Rei Macbeth durante o banquete: “ele às vezes tem isto, não reparem. Já passa”. Mas não passa, Macbeth não é controlável. Quando Lady Macbeth quer saber que maquinações homicidas o atormentam, ele rejeita-a, comporta- se como alguém que não precisa de cúmplices: “É melhor que o não saibas, minha pomba”. E a separação dá-se. Ele na sua rota, ela fora de combate, fora de campo e fora de cena. A ausência dela coincide com o início da guerra civil e a queda de Macbeth. Reaparece, no último acto, sonâmbula, a tentar tirar das mãos uma mancha de sangue que não desaparece. Quando Macbeth se prepara para o combate (mais uma profecia que se cumpre: o bosque de Birnam sobe até ao castelo de Dunsinane), ouvem-se no castelo gritos de mulheres, e Seyton anuncia a Macbeth a morte da Rainha. No final da peça, na aurora de um tempo novo, Malcolm, o primogénito de Duncan que ele próprio nomeara seu sucessor, resume o que se sabe: “o carniceiro está morto, mais a sua mulher-demónio, que, segundo consta, se matou por meios violentos”.
Lady Macbeth aparece pela primeira vez na cena V do primeiro acto lendo a carta que Macbeth lhe enviou: nessa carta, o herói da guerra-das-duas-frentes, supomos que ainda quente da matança, anuncia à mulher que lhe apareceram, numa charneca deserta, três velhas adivinhas. Saudaram-no como Barão de Glamis, que já era, depois como Barão de Cawdor, que seria, e profetizaram que havia de ser rei. Palavras não eram ditas, chegam dois emissários do Rei Duncan que saúdam Macbeth como Barão de Cawdor. “Não está vivo o Barão de Cawdor?”, pergunta Macbeth. Por enquanto, sim, mas é um traidor, será executado, e o título é teu. Esta terrível coincidência planta em Macbeth a semente da certeza: se era Cawdor contra todas as expectativas, então poderia ser Rei. O que Macbeth omite na carta para a mulher é que esses oráculos em que ele acredita sem acreditar, também disseram que a linhagem reinante viria do seu amigo Banquo, e não dos Macbeths. Que farei com esta carta?, é a pergunta evidente da Senhora. Tendo Macbeth em alta (e baixa) conta, conhecendo o “leite da bondade” que o impede de “cortar atalhos” para a Coroa, conclui que o seu papel é instigar, motivar, pô-lo em movimento no caminho que ele afinal já segue. Lady Macbeth invoca os espíritos maléficos, para que a castrem da sua parte feminina, e estanquem todo o acesso ao leite da bondade- ou seja, para que se cumpra o que ele quer, terá de ser ela o “homem” do casal. Quando Macbeth aparece, anunciando que Duncan virá visitá-los nessa noite, já o plano está montado. Macbeth, afinal, tem dúvidas. É leal ao Rei, ao bom e brando
Duncan, ele acaba de lhe conceder o baronato, trata-o como o seu campeão. Lady Macbeth é levada nas asas de um desses excessos comuns nas discussões conjugais. E tem esta fala inadmissível: “Dei de mamar, e sei/ Como é doce amar o bebé que tenho ao peito:/Mas era capaz, estando ele a sorrir para mim/ De arrancar o mamilo às gengivas desdentadas/E rebentar-lhe os miolos, se o tivesse jurado/Como tu juraste fazer isto”. Macbeth não tem por onde fugir. Sofre a alucinação do punhal, entrega a alma, deixa-se possuir, para não ter responsabilidade no acto. O que segue é o mal- enjorcado ingénuo plano de duas almas crédulas e fundamentalmente boas. Lady Macbeth intoxica os camareiros do Rei até à inconsciência. Macbeth vai, e mata. Selvaticamente, mata Duncan. Ela espera em cena, deixou-lhe os punhais para que os pusesse, ensanguentados, nas mãos dos camareiros. Mas Macbeth reentra, desvairado. Quando ela o manda lá dentro besuntar as caras dos camareiros com o sangue de Duncan, ele recusa. Não volto lá, diz. É Lady Macbeth quem pratica a pintura. O que ela vê na câmara do Rei Duncan há-de ter algum efeito. Uma coisa é imaginar o acto, outra vê-lo feito, em todo o seu sangrento pormenor. Lady Macbeth: “Olha, as minhas mãos estão da cor das tuas, mas teria vergonha de ter um coração tão branco”. Mas a imagem do velho Rei, tão parecido com o seu pai, esfaqueado e exangue, há-de ficar a fermentar naquele espírito. Por enquanto, Lady Macbeth é só metade de si própria. Aguenta o peso do homicídio que Macbeth cumpriu. Macduff, o Barão de Fife, encarregado do despertar, descobre o Rei assassinado. Segue-se grande alvoroço. Macbeth, a pedido de Macduff, entra na câmara com Lennox, volta com Lennox e Ross. Diz que a fúria o levou a matar os camareiros, ainda adormecidos. Eles eram culpados, Macbeth amava o Rei. Lady Macbeth tem aqui o seu desmaio. Julga-se que para desviar a atenção do suspeito acto de violência gratuita de Macbeth. Os filhos de Duncan, Malcolm e Donalbain, fogem à pressa, desconfiando de toda aquela encenação. Malcolm irá pedir asilo ao Rei de Inglaterra, Donalbain segue para a Irlanda. Macbeth, o herói da guerra, lança a suspeita do assassinato sobre os filhos de Duncan. Toma conta da situação. É coroado. “É bom ser rei, mas em segurança”, diz ele de si para si. Não pára de matar: Banquo, o seu maior amigo, para evitar que a sua linhagem venha a reinar, como foi vaticinado. Depois o inteiro clã Macduff, escapando apenas o nobre Macduff, a sua nemesis, o inimigo admirado, o anti-Macbeth. Lady Macbeth procura, com mão maternal, amainar os demónios de Macbeth. Com desvelos, com afagos, com censuras, com ameaças, com todo o arsenal da preocupação amorosa. Tenta minimizar os estragos das alucinações do Rei Macbeth durante o banquete: “ele às vezes tem isto, não reparem. Já passa”. Mas não passa, Macbeth não é controlável. Quando Lady Macbeth quer saber que maquinações homicidas o atormentam, ele rejeita-a, comporta- se como alguém que não precisa de cúmplices: “É melhor que o não saibas, minha pomba”. E a separação dá-se. Ele na sua rota, ela fora de combate, fora de campo e fora de cena. A ausência dela coincide com o início da guerra civil e a queda de Macbeth. Reaparece, no último acto, sonâmbula, a tentar tirar das mãos uma mancha de sangue que não desaparece. Quando Macbeth se prepara para o combate (mais uma profecia que se cumpre: o bosque de Birnam sobe até ao castelo de Dunsinane), ouvem-se no castelo gritos de mulheres, e Seyton anuncia a Macbeth a morte da Rainha. No final da peça, na aurora de um tempo novo, Malcolm, o primogénito de Duncan que ele próprio nomeara seu sucessor, resume o que se sabe: “o carniceiro está morto, mais a sua mulher-demónio, que, segundo consta, se matou por meios violentos”.